quinta-feira, 3 de maio de 2007

Há uma altura, antes de acordar, em que o sonho e a realidade se confundem.
Por vezes, o sono impede que se faça essa distinção;
de outras vezes, julgamo-nos metidos na vida sem saber que ainda não saimos do limbo nocturo.
Em todos os casos, sentimentos e emoções sobressaltam o corpo; movemo-nos para um e outro lado com a angústia da dupla existência; nada dominamos das acções que, no entanto, sofremos como se algo nos tivesse arrancado da cama.
Durante o pequeno almoço, pensando nisso, já pouco resta de qualquer coisa da noite. Nem as pessoas, nem as palavras, nem as imagens, nos atormentam com a intensidade de há pouco. Porém, é como se nos faltasse alguma coisa de nós. E, durante o dia, repetimos gestos que não sabemos a quem se dirigem; ouvimos frases de que não percebos o sentido. E não sabemos, de facto, onde encontrar uma explicação para esse diambular entre ser e não ser.
NUNO JÚDICE - POESIA REUNIDA 1967-2000

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